Marília Mendonça detonou o termo “feminejo”, bateu de frente com o mercado e mudou tudo
Quando Marília Mendonça surgiu com “Infiel” em 2016, as rádios brasileiras ainda viviam sob domínio masculino. Dois anos antes, entre as dez músicas sertanejas mais tocadas, não havia uma voz feminina sequer. A chegada de Marília não apenas rompeu essa lógica como também deu início a uma transformação estrutural: mulheres passaram a cantar as próprias dores, com letras realistas, diretas e sem filtro.
Pontos Principais:
- Marília Mendonça recusava o termo “feminejo” por considerá-lo segregador.
- Antes do sucesso como cantora, já era compositora com mais de 150 músicas gravadas.
- Suas letras abordavam traição, relações abusivas e vozes marginalizadas.
- Marília enfrentou o machismo das rádios e do mercado musical com autenticidade.
- Artistas como Simone Mendes e Mari Fernandez reconhecem seu legado como essencial.
No entanto, o nome dado a esse movimento pela imprensa — “feminejo” — a incomodava profundamente. Para Marília, o rótulo criava uma separação injusta. Em uma reunião com a gravadora, chegou a se revoltar: “Existe rock feminino? Existe MPB feminina? Então por que sertanejo tem que ser diferente?”. Ela queria o mesmo espaço dos homens, não um reservado às mulheres.
A reação à sua entrada no mercado não foi suave. Empresários e radialistas diziam que “mulher não pede música de mulher”, e que vozes femininas derrubariam a audiência. Mas “Infiel” mostrou o contrário: entrou nas mais pedidas em uma semana, virou fenômeno nacional e forçou as gravadoras a buscar mais mulheres com voz, história e autenticidade.
Antes do sucesso no palco, Marília era bastidor. Com mais de 150 composições gravadas por outros artistas, escrevia o que queria ouvir como mulher — mesmo quando eram homens que cantariam. “Ela queria colocar na boca dos cantores o que nós gostaríamos de escutar”, contou o compositor Vinicius Poeta, destacando a coragem de letras como “Cuida bem dela”, que jamais teriam partido de um homem.
O estilo único, depois apelidado de “mariliônico”, misturava dor, sarcasmo e força. Ninguém mais consegue cantar “Amante não tem lar” sem ser julgado — mas com Marília, a canção era entendida como catarse coletiva. Ela conquistava tanto a elite quanto o público popular, porque colocava sentimentos universais em letras que pareciam saídas de conversas reais.
No início da fama, Marília chegou a dizer que não era feminista, afirmando que o movimento diminuía a mulher e negando ter sofrido machismo. Foi só com o tempo e a vivência que passou a reconhecer as estruturas que a oprimiam. Em entrevistas posteriores, admitiu o sexismo do mercado sertanejo e preferiu mostrar sua resistência com exemplos práticos, como sua própria história.
E essa resistência aparecia nas músicas. Em “Troca de Calçada”, Marília dava voz a uma mulher marginalizada pela sociedade. Em “Você Não Manda Em Mim”, denunciava a violência emocional de um relacionamento abusivo. Suas letras não pediam licença nem faziam rodeios — eram documentos emocionais de vidas femininas reais.
Simone Mendes, amiga e parceira de palco, resumiu bem o espírito de Marília: “Ela chegou com a voz, com a doçura, com a beleza e disse: ‘Eu vou tomar a minha cachaça, usar a roupa que quiser, e esse é o meu corpo. Quem quiser gostar, que goste’”. Essa postura abriu portas para outras artistas serem exatamente quem são, sem disfarces.
O legado de Marília se espalhou. Mari Fernandez, chamada no início de “Marília Mendonça do piseiro”, reconhece que só chegou ao topo graças ao caminho aberto pela artista. Simone Mendes, após encerrar a dupla com Simaria, buscou a equipe de Marília — inclusive o produtor Eduardo Pepato — para sua nova fase solo. O resultado foi “Erro Gostoso”, hit que carrega a mesma assinatura emocional.
Mais do que dar voz às mulheres, Marília mostrou que elas já tinham voz — só faltava o microfone. E com ele nas mãos, ela não apenas cantou, mas transformou um gênero. Sem se curvar a modismos, sem aceitar rótulos, e sem jamais perder a verdade.
Com informações de g1.
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