Editorial: A favela venceu?
Por Bia Ludymila (MTB 0081969/SP)
Sueli Carneiro critica a frase “a favela venceu” por enfatizar o sucesso individual em detrimento da coletividade. Isso reflete a lógica neoliberal e meritocrática que valoriza aqueles que supostamente superaram os demais devido ao seu esforço pessoal. No entanto, essa visão mantém a segregação das favelas e restringe seu acesso aos direitos urbanos.
A frase se torna excludente, pois muitos dos que “venceram” abandonam a periferia para adotar os valores da elite, conforme observado por Mano Brown em sua música “Negro Drama”. O termo “favela” perdeu sua especificidade e se tornou genérico, assim como os termos “suburbano” e “periférico”. Representa não apenas uma relação geográfica, mas também uma carga simbólica de marginalização e discriminação.
A presença de discursos marginalizados em espaços culturais elitizados, como museus e galerias, gera desconforto. No entanto, mostra uma busca por reparação e reconhecimento das memórias e histórias desses grupos. A exposição “Intersecções: negros(as), indígenas e periféricos(as) na cidade de São Paulo” exemplifica essa valorização, trazendo obras de artistas que representam a cultura das periferias e rompendo com narrativas dominantes.
No entanto, a cultura periférica ainda enfrenta desafios nos museus, sendo muitas vezes enquadrada dentro do modelo de organização da história da arte branca. É fundamental repensar os processos curatoriais e a estrutura dos museus, buscando novos modelos expositivos que considerem as demandas e perspectivas das comunidades periféricas.
A exposição “Intersecções” e iniciativas semelhantes são passos importantes para romper com a marginalização e estereotipação das favelas e periferias. Por meio da cultura periférica, resistência e ativismo, os moradores das periferias reivindicam seu direito à cidade e à memória. A jornada para o reconhecimento pleno e a superação das desigualdades ainda está em andamento, e os museus têm um papel crucial ao acolherem essas novas narrativas e trabalharem em parceria com as comunidades para construir espaços mais inclusivos e igualitários.
Somente quando as vozes, experiências e perspectivas das favelas e periferias forem verdadeiramente reconhecidas e integradas, poderemos dizer que a favela e a periferia venceram, alcançando a plena cidadania e o direito de serem agentes ativos na construção da cidade.
*Com base no artigo de Alecsandra Matias de Oliveira, professora do Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação (Celacc) da Escola de Comunicações e Artes da USP, Jornal da Usp.