Caieiras, o intestino da crise do STF: juiz afastado, perito preso e possíveis ligações com o PCC
Desde a fundação da mais alta Corte brasileira, em 1891, nunca o Supremo Tribunal Federal enfrentou uma crise tão multifacetada e ruidosa como a atual. O cenário que se desenha inclui denúncias de parcialidade judicial, decisões controversas e um ambiente de desconfiança institucional. No entanto, o que poucos esperavam era que parte das raízes desse colapso institucional brotasse em uma cidade do cinturão metropolitano de São Paulo: Caieiras.
Pontos Principais:
- Ex-juiz Peter Eckschmiedt e o perito Eduardo Tagliaferro atuaram juntos em nomeações suspeitas em Caieiras.
- Tagliaferro produziu dossiês políticos e foi indiciado após atuar como assessor no TSE, a convite de Moraes.
- R$ 1,6 milhão em espécie foi encontrado na casa do juiz, junto a provas de ligação com o PCC.
- Caieiras tornou-se ponto estratégico para atividades ilegais da facção criminosa, incluindo negócios imobiliários.
- A crise escancara vulnerabilidades do Judiciário e reforça a politização de suas decisões.
É lá que se entrelaçam os nomes do ex-juiz Peter Eckschmiedt, do perito Eduardo Tagliaferro e do Ministro do STF Alexandre de Moraes. A conexão entre essas figuras vai muito além do acaso e envolve nomeações suspeitas, dossiês clandestinos, contratos com interesses privados e até mesmo envolvimento com facções criminosas. Segundo documentos oficiais, como os processos CPA 2021/14931 e RD nº 0000619-22.2021.2.00.0000 do CNJ, a atuação conjunta do juiz e do perito foi minuciosamente arquitetada para gerar ganhos ilícitos em diferentes esferas do Judiciário.
O ponto de partida dessa trama se dá quando Eckschmiedt, então magistrado da Comarca de Caieiras, passou a nomear Tagliaferro em uma sequência de processos cíveis e criminais que envolviam vultosas quantias e apurações patrimoniais. As nomeações não apenas beneficiavam financeiramente o perito, mas também alimentavam uma rede de favorecimento político que incluía adversários do prefeito Gilmar Lagoinha, como sugerem as investigações.
O rastro da associação entre os dois se estende até a Comarca de Itapevi, onde o juiz passou a atuar após o afastamento de suas funções em Caieiras. Mesmo fora do cargo, Eckschmiedt teria continuado a influenciar a escolha de peritos nos processos, inclusive nomeando a própria esposa de Tagliaferro em ações judiciais. A atuação da dupla despertou a atenção do CNJ e resultou em mandado de busca e apreensão na residência do juiz, com apreensão de celulares, computadores e R$ 1,6 milhão em dinheiro vivo — além de documentos que o ligam diretamente ao Primeiro Comando da Capital, o PCC.
A presença da facção criminosa em Caieiras, segundo as investigações, foi intensificada a partir de 2022, quando interesses da organização passaram a incluir negócios de terraplanagem, parcelamento do solo e outras atividades supostamente legais. A infiltração se deu por meio da associação com autoridades locais, revelando a vulnerabilidade do município frente à corrupção institucional.
Em paralelo, Eduardo Tagliaferro era nomeado assessor-chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral, órgão subordinado à presidência de Alexandre de Moraes. Durante esse período, foi acusado de produzir relatórios clandestinos utilizados em inquéritos sensíveis conduzidos pelo próprio ministro. As denúncias levaram à exoneração de Tagliaferro e, posteriormente, ao seu indiciamento pela Polícia Federal.
O caso ganhou contornos ainda mais alarmantes após o disparo de arma de fogo que vitimou a esposa de Tagliaferro em Caieiras. A mulher, posteriormente nomeada perita na Comarca de Itapevi, passou a ser mais uma peça do quebra-cabeça montado por Eckschmiedt. As circunstâncias do disparo, que resultaram na prisão de Tagliaferro em 2023, também constam nos registros policiais da cidade.
A sucessão de eventos expõe o uso indevido de mecanismos do sistema Judiciário para fins políticos, financeiros e até criminosos. O envolvimento de um ministro do STF, ainda que indiretamente, contribui para o desgaste da imagem da Corte e alimenta críticas de todos os espectros ideológicos. A crise, antes tratada como ruído político em Brasília, agora ganha raízes tangíveis no interior do estado paulista.
A percepção de que o Judiciário se tornou vulnerável a manipulações de bastidores mina a confiança da população nas instituições. O desequilíbrio entre os poderes, a judicialização da política e o uso político da justiça tornam-se temas centrais no debate público, e Caieiras — antes coadjuvante no mapa político nacional — emerge como símbolo desse colapso silencioso.
No centro da tempestade, a cidade se torna peça-chave no tabuleiro institucional brasileiro. O episódio serve como alerta: as entranhas da crise não estão apenas nas altas cúpulas de Brasília, mas também nos pequenos fóruns, nos gabinetes periféricos e nas relações subterrâneas entre poder, crime e silêncio institucional.
Com assessoria jurídica do escritório Polimatas
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