Fábrica no Paraná não usa transgênicos nem tem ligação com Bill Gates

Espalhou-se nas redes um vídeo alarmista que alega existir uma fábrica de mosquitos geneticamente modificados no Paraná, supostamente ligada a Bill Gates. A informação é falsa. A biofábrica Wolbito utiliza uma bactéria natural, a Wolbachia, para impedir que o Aedes aegypti transmita doenças como dengue, zika e chikungunya. A tecnologia é segura, aprovada por estudos científicos e sem qualquer vínculo com o bilionário norte-americano.
Publicado em Curiosidades dia 7/08/2025 por Alan Corrêa

Um vídeo publicado nas redes sociais no início de agosto de 2025 viralizou ao acusar uma suposta “fábrica de mosquitos” no Paraná de estar produzindo Aedes aegypti geneticamente modificados, com apoio do empresário Bill Gates. A narrativa alimentou teorias conspiratórias e espalhou desinformação, mas não corresponde aos fatos. O Estadão Verifica apurou que o local citado trata-se da biofábrica Wolbito do Brasil, que não faz uso de engenharia genética e não tem qualquer vínculo com o bilionário.

Pontos Principais:

  • Vídeo falso acusa fábrica no Paraná de modificar geneticamente mosquitos com apoio de Bill Gates.
  • A biofábrica Wolbito utiliza a bactéria natural Wolbachia para impedir a transmissão de vírus.
  • Não há qualquer alteração genética nos mosquitos nem relação com a empresa Oxitec.
  • Método é comprovado cientificamente e já foi aplicado com sucesso em várias cidades do Brasil.
  • Estudos mostram redução significativa de dengue, zika e chikungunya nas áreas de atuação.

Fundada em parceria entre o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP) e o World Mosquito Program (WMP), a Wolbito do Brasil realiza um trabalho científico reconhecido internacionalmente. A técnica utilizada é conhecida como método Wolbachia, nome da bactéria natural introduzida nos ovos do mosquito em laboratório. Essa bactéria impede a multiplicação dos vírus da dengue, chikungunya, zika e febre amarela dentro do inseto, mas não altera sua carga genética nem representa risco para humanos ou animais.

Diferentemente da Oxitec, empresa britânica responsável por projetos com mosquitos transgênicos, a Wolbito atua apenas com métodos biológicos naturais. A Wolbachia está presente em cerca de 60% dos insetos da natureza, como borboletas e abelhas. Sua aplicação em mosquitos vetores de arboviroses se mostrou eficaz e sustentável, sem o uso de modificação genética, produtos químicos ou alterações comportamentais das espécies.

Em nota enviada ao Estadão, a Wolbito reforçou que “a bactéria não foi criada em laboratório, não sofre modificação genética e não possui qualquer uso militar.” A empresa também esclareceu que seu trabalho é pautado em evidências científicas, transparência e monitoramento constante pelas autoridades de saúde. A técnica é aplicada com sucesso em países como Austrália e Indonésia, e já integra ações públicas no Brasil, em cidades como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Londrina, Joinville, Brasília e Campo Grande.

A cidade de Niterói, no estado do Rio de Janeiro, foi a primeira do país a ser integralmente coberta pelo método e se tornou referência nacional. Segundo o World Mosquito Program, entre 2020 e 2023, houve apenas 326 casos de dengue na cidade — o menor número em mais de duas décadas. Monitoramentos de longo prazo demonstraram que mais de 97% dos mosquitos locais mantinham a bactéria até oito anos após a primeira liberação, com impactos significativos na redução da transmissão de vírus.

Estudo publicado na revista científica Public Library of Science (PLOS) em 2021 evidenciou que, entre 2017 e março de 2020, houve redução de 69% nos casos de dengue, 56% nos de chikungunya e 37% nos de zika em regiões onde os mosquitos com Wolbachia foram liberados, comparado a áreas sem o método. Esses resultados reafirmam a confiabilidade da abordagem e sua relevância no combate às arboviroses urbanas.

Em Campo Grande (MS), a Wolbachia foi implementada em seis fases entre 2020 e 2024, abrangendo 74 bairros e sete regiões, atendendo mais de 900 mil moradores. Foram produzidos 2,7 kg de ovos e liberados 102 milhões de mosquitos. Os resultados das operações serão divulgados ainda este ano, juntamente com um novo estudo sobre os impactos da técnica em Belo Horizonte.

Outro dado importante é o custo-benefício da estratégia. Segundo o Ministério da Saúde, cada real investido no método Wolbachia representa economia de até R$ 500 em despesas com medicamentos, internações e tratamentos associados às doenças transmitidas pelo Aedes aegypti. Ou seja, além de segura, a técnica também é altamente eficiente em termos econômicos.

O vídeo enganoso ainda confunde a atuação da Wolbito com a da Oxitec, que realmente desenvolve mosquitos geneticamente modificados. Apesar da semelhança temática, são projetos distintos, com métodos, objetivos e fundamentos científicos diferentes. A Fundação Bill & Melinda Gates, frequentemente mencionada em desinformações, também já esclareceu que não possui relação com nenhuma iniciativa envolvendo liberação de mosquitos no Brasil.

A desinformação contida no vídeo se aproveita de temas sensíveis à população, como saúde pública e tecnologia, para espalhar medo e confusão. A distorção de dados científicos e o uso indevido de nomes conhecidos são estratégias comuns em fake news. Por isso, checagens como a realizada pelo Estadão Verifica são fundamentais para restabelecer a verdade e proteger a confiança pública em projetos baseados em evidência.

Fonte: Estadão.