Um crime ocorrido em 2018, que parecia destinado ao esquecimento nos arquivos da Polícia Civil, voltou ao centro das investigações em Francisco Morato, na Grande São Paulo. Sete anos após o estupro de uma mulher próximo a um ponto de ônibus, a identidade do autor foi confirmada por meio de uma tecnologia que vem transformando a elucidação de crimes no Brasil: o cruzamento de perfis genéticos.
Pontos Principais:
Na época, a vítima foi encaminhada ao Instituto Médico Legal, onde passou por exames periciais que confirmaram a presença de material genético masculino. Apesar disso, a falta de outros indícios impossibilitou a identificação do agressor, levando ao arquivamento do caso. O DNA, no entanto, foi armazenado no Banco Nacional de Perfis Genéticos (BNPG), à espera de um possível vínculo futuro.
O desfecho mudou quando, anos depois, o perfil genético de um homem preso por outro crime sexual foi incluído no banco de dados. O sistema apontou coincidência imediata com duas vítimas, incluindo a mulher atacada em 2018. Esse cruzamento deu início à reabertura do inquérito e ao indiciamento formal do suspeito.
Com base nesse novo elemento, a Delegacia de Defesa da Mulher de Francisco Morato solicitou ao Poder Judiciário o desarquivamento do processo. O delegado Bruno Rafael Filhiolino, responsável pela condução das investigações, elaborou um relatório final e pediu a prisão preventiva do homem, que já cumpria pena na Penitenciária de Lucélia, no interior paulista.
Segundo Filhiolino, a força probatória da análise genética deve resultar em uma condenação mais severa. O caso é um exemplo do impacto da coleta sistemática de DNA de presos, uma política adotada pelo Estado de São Paulo a partir de 2019, com exceção do período de paralisação durante a pandemia.
Esses mutirões, conduzidos pelo Núcleo de Biologia e Bioquímica do Instituto de Criminalística, reúnem equipes que percorrem penitenciárias para coletar amostras de condenados por crimes sexuais e violentos. O material é processado e integrado ao banco nacional, aumentando as chances de conexões entre crimes antigos e atuais.
Ana Claudia Pacheco, perita criminal e diretora do núcleo, destacou que a atuação vai além das análises laboratoriais. Para ela, cada identificação representa um passo significativo na reparação de danos às vítimas. “Quanto mais o Banco de Materiais Genéticos é alimentado, maiores são os resultados”, afirmou.
O trabalho exige planejamento e persistência, já que o número de presos é elevado e as coletas precisam ser realizadas em etapas. De acordo com a perita, a equipe atende tanto detentos que estão há anos no sistema prisional quanto aqueles recém-ingressos, garantindo que o banco seja atualizado constantemente.
Essa prática fortalece a capacidade de investigação e demonstra que a ciência forense pode oferecer respostas mesmo quando o tempo parece ter sepultado as chances de justiça. No caso de Francisco Morato, o avanço tecnológico uniu provas coletadas no passado com os métodos atuais, transformando um processo estagnado em um novo capítulo de responsabilização criminal.
O procedimento adotado também reforça a importância de manter registros periciais e investir na integração de bancos de dados, permitindo que casos arquivados encontrem soluções anos depois. Para as vítimas, é uma chance de ver seus agressores finalmente identificados e encaminhados à Justiça.