Um estudo divulgado pela ICC Brasil durante a São Paulo Climate Week projeta que o Brasil poderá gerar entre US$ 100 bilhões e US$ 140 bilhões por ano até 2032 com o avanço da chamada bioeconomia do conhecimento. A estimativa parte da combinação entre biodiversidade única, ciência consolidada e cadeias produtivas robustas, elementos que podem colocar o país no centro da inovação sustentável.
Pontos Principais:
A pesquisa foi construída ao longo de quatro meses, com mais de 100 participantes e 57 entrevistas, e reforça o papel estratégico do Brasil em áreas como alimentos, saúde, cosméticos, materiais biodegradáveis e agronegócio regenerativo. O potencial, segundo os dados, não é apenas econômico: trata-se de uma mudança estrutural capaz de alinhar desenvolvimento e sustentabilidade.
No setor de alimentos, a indústria nacional se apoia tanto na exportação de larga escala quanto na diversidade de espécies endêmicas de valor nutricional. Esse segmento, sozinho, pode render de US$ 40 bilhões a US$ 50 bilhões por ano. A aposta em materiais biodegradáveis e circulares projeta entre US$ 20 bilhões e US$ 30 bilhões, enquanto o agronegócio regenerativo pode alcançar US$ 18 bilhões a US$ 25 bilhões.
As oportunidades se estendem ainda ao campo da saúde, que pode gerar US$ 12 bilhões a US$ 20 bilhões anuais com bioativos, e ao setor de cosméticos sustentáveis, estimado em US$ 8 bilhões a US$ 12 bilhões. Apesar desses números expressivos, os autores do estudo alertam para o risco de perda de competitividade se não houver investimento consistente em pesquisa e inovação.
O diagnóstico mostra que menos de 10% da flora brasileira foi mapeada geneticamente e menos de 1% dos microrganismos têm seu potencial biossintético explorado. Além disso, o país ocupa apenas a 86ª posição em eficiência de inovação, ainda que figure entre os 15 que mais produzem ciência no mundo. Para mudar esse cenário, seriam necessários US$ 15,7 bilhões em investimentos públicos e privados na próxima década.
Outro entrave está na concentração de recursos. Entre 2021 e 2023, 74% dos investimentos em bioeconomia foram direcionados a bioenergia e florestas plantadas, enquanto a Amazônia Legal recebeu apenas 12% do crédito rural destinado a produtos da biodiversidade. O Sul concentrou 30% dos recursos, revelando desigualdade regional e setorial.
O estudo também aponta falhas no sistema SisGen, responsável por registrar o uso de patrimônio genético e conhecimento tradicional. Quase metade dos cadastros não apresenta resultados, 37% não informam finalidade e 25% não registram o bioma de origem. Esses dados revelam obstáculos que dificultam a transição do laboratório para o mercado, conhecidos como “vales da morte” da inovação.
Para superá-los, foram propostas cinco frentes estratégicas: fortalecer a base científica, consolidar o ecossistema de inovação, criar condições favoráveis de mercado, aprimorar a regulação e adotar uma arquitetura financeira integrada. A ideia é unir crédito, subvenções, compras públicas e incentivos fiscais em um plano estruturado.
O Brasil lidera a biodiversidade mundial, com 57% das espécies endêmicas, além de deter 24% dos peixes de água doce, 17% das aves, 13% dos anfíbios, 12% das plantas e 11% das formigas do planeta. O estudo também destaca que apenas 30% dos registros da fauna e flora possuem informações completas, o que abre espaço para novas descobertas e aplicações.
Comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas surgem como peças-chave nesse processo, por acumularem saberes empíricos sobre o uso sustentável da biodiversidade. Os especialistas defendem que a valorização desses conhecimentos é essencial para uma inovação que respeite a diversidade biocultural do país. A inclusão da sociedade civil, investidores e até a própria natureza como agente ativo da bioeconomia amplia a chamada “hélice da inovação”, indicando que o futuro sustentável brasileiro pode nascer justamente da combinação entre ciência e tradição.
Fonte: CNN